Timbre

Voto

PROCESSO: 00058.015202/2024-76

RELATOR: ADRIANO PINTO DE MIRANDA

 

da competência

Nos termos do art. 8º, inciso XLIII, da Lei nº 11.182/2005, compete à Diretoria da ANAC, em regime de colegiado, “decidir, em última instância administrativa, sobre as matérias de competência da Agência”. Essa atribuição é reforçada pelo art. 9º do Regimento Interno da ANAC (Resolução nº 381/2016), que estabelece, em seu caput, a competência da Diretoria para analisar, discutir e deliberar sobre os assuntos afetos à atuação institucional da Agência

Considerando ainda a natureza pública de uma das partes envolvidas e que o Estado deve promover, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos, nos termos do art. 3º, §2º, do Código de Processo Civil (CPC), bem como que todos os sujeitos do processo, inclusive a Administração Pública, devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva (art. 6º do CPC), resta evidente a competência da Diretoria Colegiada da ANAC para deliberar sobre a conveniência e a oportunidade da autorização da celebração do acordo tratado no presente feito.

 

DA análise e fundamentação

Conforme relatado, trata-se de proposta de acordo apresentada pela empresa RIMA – Rio Madeira Aviação Ltda. (SEI 11274255), com o objetivo de pôr fim às controvérsias relativas às sanções aplicadas pela ANAC, as quais também são objeto das ações judiciais nos 1001011-71.2018.4.01.4100, 1004633-61.2018.4.01.4100 e 1000400-50.2020.4.01.4100, nas quais a empresa pleiteia a anulação de diversos Autos de Infração lavrados pela Agência.

Nos termos da Nota Jurídica nº 00042/2025/NAP-CONT/EDCJUD1/PGF/AGU (SEI 11496522), encaminhada à Procuradoria Federal Especializada junto à ANAC, restou consignado que o atual panorama jurisprudencial se apresenta majoritariamente desfavorável à tese defendida pela Agência, tanto no âmbito do Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região quanto no Superior Tribunal de Justiça (STJ), especialmente no que se refere à aplicação, no âmbito administrativo, da dosimetria prevista no art. 71 do Código Penal (continuidade delitiva). Embora haja, recentemente, decisões que apontam a possibilidade de revisão desse entendimento, a própria Nota Jurídica reconhece que, no momento, não há segurança suficiente quanto à reversão do entendimento firmado nas instâncias judiciais competentes, o que eleva o grau de risco na manutenção dos litígios. 

Ademais, conforme manifestação da própria empresa, os litígios judiciais se tornariam desnecessários caso a Agência adotasse administrativamente a metodologia da infração continuada, já reconhecida no âmbito da regulação da ANAC desde a edição da Resolução nº 566/2020, entendimento que orientou as avaliações internas para definição do valor de referência para composição, no montante de R$ 678.200,20 (seiscentos e setenta e oito mil, duzentos reais e vinte centavos).

No decorrer das tratativas, restou consolidado que a proposta da empresa (SEI 11274255) contempla, entre as cláusulas relevantes para este momento, aquelas relativas às condições de pagamento, consistindo na quitação do valor de referência proposto pela Agência, parcelado em 120 (cento e vinte) meses, dispensando-se a incidência de juros moratórios, juros remuneratórios e multa. 

Embora a proposta apresente a dispensa desses encargos financeiros, entende-se necessário, para preservação do valor real da obrigação, que haja atualização monetária das parcelas, por índice de inflação oficial, em consonância com a legislação aplicável e a jurisprudência consolidada. Assim, o valor reconhecido deve constituir a base para o parcelamento, a ser realizado em até 120 (cento e vinte) parcelas mensais, sucessivas, com a incidência, nestas parcelas, de atualização monetária superveniente após a assinatura do acordo. Outra alternativa a ser considerada, por simplificação operacional, é o parcelamento anual, o que resultaria em 10 (dez) parcelas anuais.

Propõe-se, assim, que a atualização seja feita por meio da aplicação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumulado entre o momento em que foi acordado o valor de referência de R$ 678.200,20 (índice de março de 2025*) e o momento do início do efetivo pagamento (aplicando-se o último índice disponível). A partir de então os saldos seriam atualizados pelo IPCA acumulado, o que pode ser feito anualmente, conforme arranjos contratuais mais comuns, ou mensalmente, a critério do juízo competente.

Fica claro, portanto, que se trata de concessão recíproca entre as partes, que contribui para a efetividade da recuperação do crédito público, em linha com o disposto no art. 22-D da Lei nº 13.988/2020 e na Portaria Procuradoria-Geral Federal (PGF) nº 498/2020, fundamentada na busca pela solução consensual do conflito, na superação da incerteza jurídica decorrente dos litígios judiciais e na viabilidade econômica do adimplemento da obrigação por parte da empresa.

Importante ressaltar que a adoção desta metodologia proposta ao caso concreto não constitui precedente para sua aplicação em situações ocorridas após a vigência da Resolução nº 566/2020, cuja sistemática própria já reflete, de forma adequada, os princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da eficiência no âmbito sancionador regulatório. Portanto, a presente proposta de acordo guarda estrita relação com o contexto normativo e fático específico dos autos, não devendo ser interpretado como sinalização para adoção dessa lógica em casos supervenientes à consolidação do marco regulatório vigente, tampouco deve representar flexibilização dos parâmetros normativos vigentes ou qualquer alteração na sistemática sancionatória atualmente adotada pela Agência.

É imprescindível, ainda, a inclusão de cláusula resolutiva no acordo, de modo que o inadimplemento, caracterizado pelo não pagamento de parcelas consecutivas ou alternadas, ou, ainda, pelo descumprimento de qualquer obrigação essencial acordada, enseje a imediata rescisão, com o consequente vencimento antecipado das parcelas vincendas, a execução do saldo devedor atualizado e a adoção das medidas administrativas e judiciais cabíveis.

No que se refere à capacidade econômico-financeira, destaco a existência de contratos ativos com o governo estadual (SEI 10833684), bem como a constatação de adimplência junto à ANAC desde abril de 2024 (SEI 11654966), o que evidencia a responsabilidade da empresa na gestão de suas obrigações financeiras. O valor da parcela mensal, estimado em aproximadamente R$ 5,5 mil (ou R$ 68 mil anuais), mostra-se compatível com o porte da empresa, que opera sob o RBAC nº 135, o qual exige estrutura técnico operacional com custos relevantes. Esses elementos, aliados à cláusula resolutiva acima proposta, configuram um cenário de proteção suficiente que resguarda o interesse público.

Diante desse contexto, considerando ainda a manifestação da empresa (SEI 11274255), na qual reafirma seu interesse na celebração do acordo; a manifestação da Procuradoria Federal Especializada junto à ANAC (SEI 11496540), que concluiu pela maturidade do processo para apreciação desta Diretoria Colegiada; o elevado risco jurídico e financeiro associado à manutenção dos litígios; os princípios da conveniência, da oportunidade, da eficiência e da racionalidade administrativa, além da diretriz legal que orienta a Administração Pública a buscar, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos, nos termos do artigo 3º, §2º, e do artigo 6º do CPC, entendo que a autorização para celebração do acordo, nos termos propostos, com as ressalvas ora consignadas quanto à atualização monetária do parcelamento e às garantias do adimplemento, representa a medida mais adequada e alinhada ao interesse público.

Acredita-se que a medida, ademais, promove segurança jurídica, celeridade na resolução do conflito, redução de despesas processuais e recuperação de crédito de difícil exigibilidade, mediante solução compatível com a capacidade financeira demonstrada pela empresa e em estrita observância às diretrizes legais e institucionais aplicáveis.

 

DA conclusão

Ante o exposto, por entender que a celebração de acordo substitutivo configura medida conveniente, oportuna e alinhada ao interesse público, VOTO FAVORAVELMENTE à autorização para celebração do acordo com a empresa RIMA – Rio Madeira Aviação Ltda., considerando o valor reconhecido de R$ 678.200,20 (seiscentos e setenta e oito mil, duzentos reais e vinte centavos), com data-base de março de 2025, e o prazo sugeridos na manifestação da empresa (SEI 11274255).

O acordo deverá observar, ainda, conforme proposto nos parágrafos 2.6 e 2.9 deste voto, a atualização monetária superveniente das parcelas a serem pagas pela empresa e conter cláusula resolutiva que preveja que o inadimplemento ensejará sua imediata rescisão, com vencimento antecipado das parcelas vincendas e adoção das medidas administrativas e judiciais cabíveis, bem como os requisitos constantes do art. 3º da Portaria PGF nº 498/2020.

Encaminhem-se os autos à Procuradoria Federal Especializada junto à ANAC para adoção das providências cabíveis, incluindo a elaboração da nova minuta do acordo e sua condução até a respectiva formalização e homologação judicial.

 É como voto.

 

ADRIANO PINTO DE MIRANDA

Diretor Substituto

 

* Índice nacional de preços ao consumidor amplo (IPCA) geral: índice (dez. 1993 = 100). Índice de março de 2025 = 7.245,3800. Disponível em: https://www.ipeadata.gov.br/ExibeSerie.aspx?stub=1&serid=36482&module=M.


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Documento assinado eletronicamente por Adriano Pinto de Miranda, Diretor, Substituto, em 10/06/2025, às 11:15, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 4º, do Decreto nº 10.543, de 13 de novembro de 2020.


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