Timbre

Voto

PROCESSO: 00058.050948/2021-83

RELATOR: TIAGO SOUSA PEREIRA

 

DA COMPETÊNCIA

A Lei nº. 11.182, de 27 de setembro de 2005, em seu art. 11, inciso V, estabelece a competência da Diretoria da ANAC para exercer o poder normativo da Agência. Referida competência também é refletida no Regimento Interno da ANAC, Resolução nº. 381, de 2016, art. 9º, VIII.

O Decreto nº 5.731, de 20 de março de 2006, que aprova o regulamento da ANAC, por sua vez estabelece que à Diretoria compete, em regime de colegiado, analisar, discutir e decidir, em instância administrativa final, as matérias de competência da Agência, bem como exercer o poder normativo da ANAC (art. 24, inciso VIII).

Destaca-se ainda que, nos termos da Portaria nº. 3.829, de 23 de dezembro de 2020, foi incluído na Agenda Regulatória da ANAC para o 2021-2022 o tema Acessibilidade de passageiros com necessidade de assistência especial (PNAE) ao transporte aéreo – Resolução nº 280/2013, que se materializou no presente processo.

Nesse sentido, fica evidente a competência da Diretoria Colegiada da Agência para analisar a presente proposta normativa.

 

da análise e fundamentação

Conforme exposto no Relatório (SEI 11052711), o presente processo decorre das discussões e estudos sobre o tema acessibilidade de passageiros com necessidade de assistência especial (PNAE) ao transporte aéreo, que compõe a Agenda Regulatória da Anac para o biênio 2023-2024.

 

Os trabalhos sobre essa temática resultaram na proposta de Resolução em deliberação, motivada por problemas regulatórios identificados no contexto de atuação da Anac, voltados à garantia da devida assistência ao passageiro que necessita de assistência especial para fazer uso do serviço de transporte aéreo. A análise aprofundada apresentada no Relatório de Análise de Impacto Regulatório (SEI 8503951) permitiu a subdivisão do problema em quatro pontos específicos, a saber:

Fundamentada nos princípios de acessibilidade, não discriminação, autonomia do indivíduo, informação adequada e segurança operacional, a propositura da norma expõe um compromisso da Agência com a inclusão, a dignidade do indivíduo e a segurança da aviação civil. Ao longo do processo normativo, identificou-se a oportunidade de reformular amplamente a atual Resolução 280/2013[1], que dispõe sobre o tema, considerando as alterações legislativas e regulatórias sucedidas desde a sua publicação. Essa remodelagem normativa também buscou alinhar-se aos padrões internacionais e otimizar o texto da norma, sem comprometer o mérito do regramento.

 

Para isso, a construção da proposta envolveu um largo levantamento de subsídios junto a agentes do setor, usuários do transporte aéreo, diversos órgãos e entidades relacionados ao tema, unidades técnicas da Anac, bem como, uma extensa coleta de informações de canais de atendimento ao consumidor e de demandas e documentos institucionais relativos à regulamentação vigente.

 

Com as informações dispostas, os problemas regulatórios identificados revelaram a necessidade de superar lacunas de informação tanto por parte dos passageiros quanto dos transportadores aéreos, evidenciando a importância de uma comunicação clara e tempestiva para assegurar a prestação adequada da assistência. A proposta normativa, portanto, incorporou diretrizes para corrigir essas assimetrias, incluindo a obrigatoriedade do passageiro informar previamente sua condição e necessidades e do transportador aéreo facilitar a comunicação, de forma a se permitir uma análise apropriada do pedido de assistência especial e assim uma prestação adequada do serviço.

 

Outro problema amplamente debatido no projeto diz respeito ao acompanhante do passageiro que requer assistência especial. Prevaleceu nessa discussão o direito do PNAE à autonomia e autodeterminação para viajar em condições de igualdade aos demais passageiros, sem custos adicionais, incluindo a opção de viajar desacompanhado. No entanto, quando o transportador aéreo exigir a presença de um "assistente de segurança operacional" devido a uma condição severa de limitação do PNAE, como, por exemplo, passageiros que possuam severo Transtorno do Espectro Autista (TEA) ou dificuldades motoras e intelectuais severas, a proposta normativa assegura a isenção do valor total da passagem aérea para o assistente, exceto no que se refere aos custos de tarifas aeroportuárias, visto a inviabilidade da viagem desacompanhada.

 

O racional regulatório da inovação é assegurar iguais condições de acesso ao transporte aéreo, permitindo que passageiros que necessitam, por motivos de segurança operacional, do acompanhamento de um assistente, não tenham ônus com a aquisição de bilhetes adicionais. Trata-se, portanto, de medida de equidade, que assegura ao PNAE, com restrições de autonomia que inviabilizam seu transporte desacompanhado, igualdade de acesso ao transporte aéreo, com relação aos demais passageiros.

 

Por este motivo, a isenção do bilhete do acompanhante assistente só se aplica àqueles passageiros que, sem o acompanhamento necessário, teriam seu acesso ao transporte aéreo negado, por razões de segurança operacional. Este importante mecanismo de equidade se direciona exclusivamente às situações em que a exigência de um assistente seja comprovada, privilegiando, como regra, a autonomia do indivíduo. 

 

Nesse sentido, e com o objetivo de preservar a finalidade do instrumento e garantir a sua aplicação adequada, proponho a readequação do art. 17, de modo a contemplar a indicação prévia pelo passageiro, no momento da aquisição do bilhete aéreo, das condições que possam ensejar, após avaliação da empresa aérea, a necessidade de um assistente de segurança operacional:

Art. 17. O PNAE com condição severa de limitação de autonomia ou mobilidade é impedido de viajar desacompanhado por avaliação do transportador aéreo sempre que:

...

§ 1º PNAE, ao prestar a informação prévia prevista no art. 9º, deverá especificar eventuais condições severas que possam impactar a segurança operacional, conforme incisos I a III do caput deste artigo para avaliação técnica pelo transportador aéreo, bem como os dados do passageiro que poderá receber a isenção prevista na alínea b do § 1º deste artigo.

§ 2º Na hipótese do parágrafo 1º, deverá a empresa avaliar se as informações prestadas pelo PNAE configuram a necessidade de um assistente de segurança operacional.

 

Adicionalmente, o normativo reforça as responsabilidades dos agentes envolvidos com a prestação de serviço – operadores de aeródromo e transportadores aéreos – para uma atuação coordenada e responsável a fim de disponibilizar equipamentos de ascenso e descenso, como rampas, sistemas de elevação e cadeiras escaladoras, adequados à aeronave, ao aeroporto e, principalmente, à condição previamente informada pelo PNAE. Ressalta-se, ainda, a vedação expressa de carregar manualmente o passageiro, salvo em situações de emergência, considerando que essa prática não apenas compromete a segurança física do PNAE e dos funcionários envolvidos, mas também fere sua dignidade e autonomia. Essa vedação reflete o compromisso do normativo em promover um atendimento humanizado, priorizando o uso de tecnologias e métodos seguros que respeitem os direitos das pessoas assistidas e assegurem sua integridade física e moral.

 

Além dessas principais mudanças, a proposta também contempla oportunidades de melhorias em medidas que assegurem a não cobrança por ajudas técnicas e assentos adicionais para o PNAE, com limites alinhados aos padrões internacionais, e o aprimoramento do controle de qualidade na assistência.

 

Ainda, buscou-se promover a equidade no tratamento do PNAE ao ajustar a redação da norma para estabelecer que as restrições para a ocupação de assentos em saídas de emergência sejam as mesmas aplicáveis a qualquer outro passageiro, em conformidade com os Regulamentos Brasileiros da Aviação Civil (RBAC nº 121 e nº 135). A medida reafirma o tratamento isonômico, considerando exclusivamente critérios técnicos aplicáveis na avaliação individual das condições do passageiro.

 

Da análise dos autos, observa-se que foram empreendidos esforços significativos para estudar os desafios regulatórios da acessibilidade no transporte aéreo. Destaca-se o comprometimento da equipe do projeto juntamente com as áreas técnicas da Anac diretamente envolvidas com tema, assim como o diálogo com instituições externas, com expertise na promoção de direitos das pessoas com deficiência, para o desenvolvimento da aviação civil.

 

Diante disso, faço um convite a toda sociedade, órgãos governamentais e não governamentais e todas as entidades relacionadas à pauta da inclusão e acessibilidade a participarem ativamente do processo de consulta e audiência públicas aqui proposto. A contribuição de diferentes perspectivas será essencial para o aperfeiçoamento desta iniciativa. Ademais, proponho à área técnica que estimule a participação de entes governamentais, legislativo e da indústria por meio do encaminhamento de carta de abertura da consulta e audiência públicas, convidando-os para contribuir com a norma e subsidiar a tomada de decisão da Agência.

 

Na oportunidade, aproveito para agradecer a todos os envolvidos neste processo, com especial destaque para a equipe da Superintendência de Acompanhamento de Serviços Aéreos (SAS), às áreas técnicas da Agência, à Secretaria Nacional de Aviação Civil do Ministério de Portos e Aeroportos, à Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, ao Ministério Público e aos demais órgãos que têm contribuído para a consolidação deste projeto, que tem como um de seus pilares a promoção de uma sociedade mais inclusiva e justa, com a eliminação de barreiras e a criação de um ambiente mais acessível, igualitário e seguro no transporte aéreo.

 

do voto

Ante o exposto e com base no conteúdo dos autos, VOTO FAVORAVELMENTE à instauração de consulta pública, pelo prazo de 60 (sessenta dias), acompanhada da realização de audiência pública, acerca proposta de resolução sobre os procedimentos relativos à assistência especial e acessibilidade de passageiros com necessidade de assistência especial ao serviço de transporte aéreo e dá outras providências, nos termos da Proposta de Ato (SEI 10843947).

 

Encaminhem-se os autos à SAS para a adoção das providências cabíveis, em especial, os itens 2.10 e 2.15.

 

É como voto.

 

TIAGO SOUSA PEREIRA

Diretor - Relator

 


[1]Resolução nº 280, de 11 de julho de 2013


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Documento assinado eletronicamente por Tiago Sousa Pereira, Diretor, em 05/02/2025, às 17:17, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 4º, do Decreto nº 10.543, de 13 de novembro de 2020.


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  SEI nº 11126692