Timbre

Voto

PROCESSO: 00058.032226/2020-66

RELATOR: ADRIANO PINTO DE MIRANDA

 

da competência

A Lei nº 11.182/2005, em seus artigos 8º e 11, estabelece a competência da ANAC para adotar as medidas necessárias para o atendimento do interesse público e para o desenvolvimento e o fomento da aviação civil, bem como a competência da Diretoria Colegiada para apreciar, em grau de recurso, as penalidades impostas pela ANAC. 

A Lei nº 11.182/2005, em seu art. 8º, incisos XVI e XXXV, combinado com o art. 64 da Lei nº 9.784/1999, estabelece a competência da Agência para fiscalizar as aeronaves civis, seus componentes, equipamentos e serviços de manutenção e decidir, em último grau de recurso, sobre as matérias de sua competência.

Adicionalmente, a Resolução nº 472/2018, em seu art. 46, delimita quando o recurso à Diretoria é cabível, quais sejam, nos casos de multa acima de R$ 100.000,00 (cem mil reais) ou na aplicação de sanções de cassação ou suspensão, como é o caso em tela.

Nesse sentido, fica evidente a competência da Diretoria Colegiada da Agência para apreciar o recurso administrativo em análise.

 

DA análise e fundamentação

Conforme exposto no Relatório[1], trata-se de recurso administrativo[2] protocolado pelo interessado em virtude de decisão conjunta de processos sancionadores autuados devido a supostas irregularidades nos registros da OS 015/18 e na Ficha de Peso e Balanceamento correspondente da aeronave PT-HDT. 

De partida, o recorrente pleiteia reforma da decisão questionando o uso de relatos fornecidos pela polícia civil e apresentando uma série de depoimentos e evidências que comprovariam a prestação do serviço de peso e balanceamento. Grande parte dos questionamentos se revolvem acerca da data informada nos documentos apresentados à Agência. Neste ponto, considero que caberia à esfera judicial a ponderação quanto à admissibilidade de tais provas para a comprovação de tais alegações. No entanto, reitero que, a partir da denúncia recebida, a fiscalização da ANAC também atuou para coletar evidências acerca do descumprimento da legislação aplicável, não cabendo qualquer questionamento acerca da veracidade dessas evidências. 

Conforme fundamentado na Decisão de Primeira Instância[3], foram consideradas outras inconsistências e irregularidades com relação aos registros efetuados, mais especificamente discrepâncias identificadas quanto aos certificados de calibração apresentados e quanto às diferentes versões da ficha de peso e balanceamento, sendo constatada a apresentação de três versões do mesmo documento, inclusive com valores de pesagem distintos em uma das fichas. Sobre esses documentos, a defesa menciona tão somente as irregularidades relacionadas a calibração da balança não apresentando fatos novos acerca da produção desses documentos. 

No entanto, nos termos da fundamentação constante no Parecer nº 322/2020/GTFI/GEOP/SFI, a fiscalização da ANAC identificou que: 

Em avaliação mais detalhada, verifica-se que a ficha de peso e balanceamento da aeronave PT-HDT enviada fisicamente à ANAC (4443574) difere daquela obtida pela Agência durante vistoria da aeronave entre 03 e 05/09/2019 (4396262). Não obstante, uma terceira versão do documento foi enviada à ANAC pela operadora da aeronave PT-HDT no processo 00066.001818/2020-37, cuja cópia foi anexada neste processo no Anexo 2 (4563441).

[...]

Observa-se que as três fichas possuem mesma numeração, mesma data e se referem à mesma aeronave PT-HDT.

Conforme detalhes 1A, 2A e 3A, a ficha obtida na vistoria de Set/2019 possui valores de pesagem diferentes das outras duas fichas.

As fichas fornecidas pela HORA Hangar, Oficina e Recuperação de Aviões Ltda. e pela Helicenter Táxi Aéreo Ltda. possuem mesmos valores de pesagem e ambas não possuem informação de peso em kgf. Todavia, possuem erros grosseiros, como diferença entre o peso medido e o peso líquido, mas com tara igual a zero.

 

Ressalta-se que, de acordo com o disposto na NOTA 2 do parágrafo 5.5.12.7 da IS 145-009, é aceitável a realização de correção de registros desde que o cancelamento não o torne ilegível, sendo recomendável a utilização de um traço simples sobre a informação cancelada. Sendo assim, a existência de três fichas de peso e balanceamento distintas, sugerindo sua reemissão com conteúdos diferentes, seria condição suficiente para a comprovação da apresentação de informação inexata ou adulterada. 

Conforme posicionamento exarado pela área técnica, essa constatação aponta o descumprimento ao disposto no parágrafo 43.12 do Regulamento Brasileiro da Aviação Civil (RBAC) nº 43, podendo ser aplicada, portanto, a penalidade de suspensão cumulada com multa conforme previsão do regulamento exposto abaixo: 

RBAC 43 (...)

43.12 Registros de manutenção - falsificação, reprodução ou alteração

(a) Ninguém pode fazer ou induzir que seja feita:

(1) qualquer anotação fraudulenta ou intencionalmente falsa em qualquer registro ou relatório cuja produção, conservação ou uso para demonstrar conformidade com qualquer requisito previsto por este regulamento seja requerido;

(...)

(b) Qualquer pessoa que cometa um ato proibido pelo parágrafo (a) desta seção poderá ter sua licença de tripulante, despachante operacional de voo ou mecânico de manutenção aeronáutica, ou seu certificado de organização de manutenção, de operador ou de produção ou, ainda, sua autorização de produção segundo uma OTP, um APAA ou suas especificações de produtos ou processos, como aplicável, suspensos ou cassados pela ANAC.

 

Quanto às teses subsidiárias, primeiramente o requerente alega suposto bis in idem, questionando a instauração de diferentes processos administrativos derivados do mesmo contexto fático. Sobre esse ponto, de fato, dos seis processos mencionados, quatro deles foram reunidos para prolação de decisão conjunta e os dois processos restantes foram arquivados segundo essa mesma tese. Ainda neste sentido, entendo que a decisão de primeira instância afastou o suposto descumprimento de Termo de Cessação de Conduta (TCC) justamente por considerar que não foram apresentadas informações inexatas novas, mas que foram apresentadas informações inexatas que mantinham a mesma posição a respeito dos fatos. Diante dessas ponderações, entendo que o afastamento de descumprimento de TCC deveria ser suficiente para afastar também a aplicação da sanção oriunda desse instrumento, de forma a se preservar a observância do princípio de non bis in idem. 

Quanto aos questionamentos levantados acerca da aplicação das circunstâncias agravantes, considero pertinente o argumento apresentado de que caberia a aplicação da Súmula Administrativa nº 2/2019 para o caso da obtenção de vantagem. Isso porque a decisão da instância de origem relata como vantagem a própria demonstração de cumprimento do requisito o que seria inerente à prática infracional. Em relação à agravante de exposição ao risco, no caso concreto, verificou-se que o serviço de peso e balanceamento foi, em algum momento, efetivamente realizado, o que contribuiu para mitigar os riscos associados à operação da aeronave. Diante disso, e considerando as particularidades deste caso, entendo pelo afastamento das circunstâncias agravantes previstas nos incisos III e IV do §2º do art. 22 da Resolução nº 25/2008.

Em relação aos pedidos de redução do prazo de suspensão e à proporcionalidade das multas aplicadas, ressalto que a dosimetria dessas medidas são consequência da aplicação das circunstâncias atenuantes e agravantes previstas na Resolução nº 25/2008, vigente na data das infrações mencionadas. Sendo assim, o afastamento das agravantes de obtenção de vantagem e de exposição ao risco abordadas no parágrafo anterior implica uma redução de 60 dias no prazo originalmente previsto para a penalidade, totalizando 60 dias de suspensão. Tal ajuste está em conformidade com o disposto no art. 60 da Instrução Normativa (IN) nº 08/2008.

 

DA conclusão

Ante o exposto, VOTO PELO PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO E PELA REFORMA DA DECISÃO proferida pela primeira instância (SEI 10994973), de modo a desconsiderar as circunstâncias agravantes, previstas nos incisos III e IV do §2º do art. 22 da Resolução nº 25/2008, e pelo arquivamento dos Autos de Infração referentes aos processos nº 00058.032231/2020-79 e nº 00058.032232/2020-13, resultando na aplicação das seguintes penalidades: 

com relação aos processos nº 00058.032226/2020-66 e 00058.032227/2020-19, aplicar em face dos interessados HORA-HANGAR OFICINA E RECUPERACAO DE AVIOES LTDA e ARLINDO DIAS BARBOSA, sanção de multa no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), devendo ambos responderem solidariamente pelo adimplemento do crédito;

com relação aos processos nº 00058.032226/2020-66 e 00058.032228/2020-55, aplicar em face dos interessados HORA-HANGAR OFICINA E RECUPERACAO DE AVIOES LTDA e CLEYTON GOBBI, sanção de multa no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), devendo ambos responderem solidariamente pelo adimplemento do crédito;

com relação ao processo nº 00058.032226/2020-66 aplicar em face da OM HORA-HANGAR OFICINA E RECUPERACAO DE AVIOES LTDA sanção de suspensão por 60 (sessenta) dias do Certificado de Organização de Manutenção nº 196804-03/ANAC.

Encaminhem-se os autos à ASJIN para as providências cabíveis.

É como voto.

 

ADRIANO PINTO DE MIRANDA

Diretor Substituto

____________________________

[1] Relatório de Diretoria 11410929

[2] Recurso Administrativo 2a. Instância OM HORA (11262431)

[3] Decisão Primeira Instância - PAS 514 (10994973)


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Documento assinado eletronicamente por Adriano Pinto de Miranda, Diretor, Substituto, em 29/04/2025, às 12:10, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 4º, do Decreto nº 10.543, de 13 de novembro de 2020.


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