Voto
PROCESSO: 00058.098660/2024-32
RELATOR: adriano pinto de miranda
DA COMPETÊNCIA
Nos termos dos artigos 8º e 11 da Lei nº 11.182, de 27/09/2005, cabe à Anac adotar as medidas necessárias para o atendimento do interesse público e para o desenvolvimento e fomento da aviação civil, da infraestrutura aeronáutica e aeroportuária do País. À Diretoria Colegiada incumbe, adicionalmente, o exercício do poder normativo da Agência.
Por força do Regimento Interno, aprovado pela Resolução nº 381, de 14/07/2016, conforme art. 9º, inciso XXII, também compete ao Colegiado deliberar, na esfera administrativa, quanto à interpretação da legislação, decidir sobre casos omissos e apreciar, em última instância, as matérias de competência da Agência.
Adicionalmente, a atuação da ANAC como instância de composição administrativa neste processo de alocação de frequências no Aeroporto de Fernando de Noronha (SBFN) encontra respaldo no seu papel institucional previsto no inciso XX do artigo 8º da Lei nº 11.182, de 27/09/2005.
Conclui-se, portanto, que a matéria em análise insere-se no âmbito de competência da Diretoria Colegiada da Anac, estando o encaminhamento feito pela Superintendência de Acompanhamento de Serviços Aéreos (SAS) devidamente revestido de amparo legal.
DA ANÁLISE E FUNDAMENTAÇÃO
Conforme exposto no relatório (SEI 11414284), trata-se de pedido de reconsideração apresentado pela empresa TAM Linhas Aéreas S.A. (LATAM), em face da distribuição de frequências realizada em SBFN, promovida pela ANAC nos termos dos Ofícios nº 7 e 9/2025/GTRC/GEAM/SAS-ANAC (SEI 11275279 e 11360399).
Na petição (SEI 11395635), a LATAM solicita a ampliação da alocação de frequências em SBFN, de cinco para sete voos semanais. Fundamenta o pleito na existência de acordo de codeshare com a Voepass, alegando que, em razão disso, as frequências anteriormente atribuídas àquela empresa deveriam ser redirecionadas à LATAM.
A distribuição de frequências no Aeroporto de Fernando de Noronha, cuja operação com aeronaves a jato foi recentemente retomada, foi conduzida pela ANAC em caráter moderador, com fundamento no art. 8º, inciso XX, da Lei nº 11.182/2005.
Embora o aeroporto não enfrente escassez física de infraestrutura, há uma limitação imposta pelos entes competentes quanto ao número máximo de turistas autorizados a ingressar na ilha, por razões de ordem ambiental.
Nesse contexto, a distribuição de frequências não se destina a regular a infraestrutura aeroportuária em si, mas atua como instrumento regulatório indireto, com o objetivo de assegurar o cumprimento das restrições ambientais e apoiar o controle do fluxo de visitantes no arquipélago. Trata-se, portanto, de uma ação orientada à proteção ambiental, no exercício das competências legais da Agência relacionadas à prestação dos serviços aéreos.
Para nortear a moderação, Superintendência de Acompanhamento de Serviços Aéreos (SAS) observou critérios técnicos, considerando: (i) o histórico de operações das empresas antes da restrição da pista para operações com aeronaves a jato (portanto, antes de 12/10/2022); (ii) a manutenção da conectividade com a ilha durante o período de restrição; (iii) a necessidade de estímulo à concorrência na localidade; e (iv) as limitações de ingresso de turistas, definidos por autoridade competente. A distribuição, formalizada por meio dos Ofícios nº 7 e nº 9/2025/GTRC/GEAM/SAS-ANAC, assegurou alocação proporcional e transparente às empresas AZUL, GOL e LATAM, com parâmetros objetivos e flexíveis – admitindo, inclusive, ajustes de aeronaves e rotas, desde que respeitados os limites mensais de turistas atribuídos a cada empresa:
Distribuição da ANAC |
|||
Empresa Aérea |
Aeronave |
Assentos |
Freq. Semanal |
Azul |
E195-E2 |
136 |
18 |
Gol |
B737 |
138 |
11 |
Voepass* |
AT72 |
68 |
0 |
Latam |
A319 |
144 |
5 |
Tabela 1: Distribuição dos voos pela ANAC (freq. semanal)
* não foi realizada distribuição em prol da Voepass, haja vista a recente suspensão do COA da empresa.
Com base nos parâmetros estabelecidos pela própria Empetur, considerando os valores de load factor de assentos (71%) e de turistas (80%), chegou-se à quantidade mensal de assentos ofertados e de turistas transportados por empresa aérea:
Tabela 2: Quantidade mensal de assentos ofertados e turistas por empresa aérea (ANAC)
A manifestação da LATAM (SEI 11395635), apresentada em 07/04/2025, foi tratada como pedido de reconsideração e teve seu pleito indeferido pela SAS por meio do Despacho SEI 11406479, de 11/04/2025, com fundamento na manutenção dos critérios adotados na alocação original. Os autos então foram encaminhados para avaliação deste Colegiado.
Passo à análise de mérito do pedido.
Registro que o trabalho desenvolvido pela SAS buscou solução administrativa para um contexto regulatório singular, no qual as limitações de acesso ao aeroporto decorrem de restrições ambientais impostas – e não da infraestrutura aeroportuária em si, não se aplicando integralmente a Resolução ANAC nº 682/2022.
Em consonância com o posicionamento final da SAS, exarado por meio do Ofício nº 9/2025/GTRC/GEAM/SAS-ANAC (SEI 11360399), de 01/04/2025, entendo que a distribuição das frequências observou critérios técnicos objetivos e flexíveis, com possibilidade de ajustes operacionais, desde que respeitados os limites mensais de turistas por transportadora.
Destaco a preocupação concorrencial indicada pela área técnica, sem deixar de levar em consideração o histórico de operações das empresas no aeroporto no período anterior à restrição da pista (antes de 12/10/2022). Em outros termos, não se trata de caso de aplicação direta do arcabouço regulatório em vigor para aeroportos coordenados (com efeito, SBFN não é um aeroporto coordenado). Por outro lado, parece irrazoável não observar em alguma medida o histórico de operações previamente à limitação da infraestrutura.
Nesse sentido, entendo que a alocação realizada pela unidade técnica atende aos fatores mais relevantes para o caso concreto: histórico de operações, continuidade do serviço, ampliação da concorrência e, em particular, os limites de ingresso de turistas. Corroboro, ainda, o entendimento da área técnica no sentido de que acordos de código compartilhado (codeshare) têm natureza meramente comercial e não têm, portanto, o condão de refletir em alocação de frequências. Nesse contexto, tenho que a alocação deve ser mantida e o recurso desprovido.
É de se observar, todavia, que o que se pleiteia na prática é a alocação de duas frequências semanais adicionais em relação às cinco frequências já alocadas, o que resultaria em um total de sete frequências semanais (o mínimo para uma operação diária). Ainda que não se trate de caso idêntico, é de se citar precedente desta Diretoria Colegiada em situação bastante similar. No processo 00058.001054/2024-11, que trata de diretriz de política pública emanada pelo Ministério de Portos e Aeroportos (MPor) que gerou restrição operacional no Aeroporto Santos Dumont (SBRJ), o resultado da alocação final de slots implicaria, para a empresa Voepass, em um número de frequências inferior a sete semanais, o que impossibilitaria a realização de uma operação em todos os dias da semana. Apresentado pedido semelhante ao ora em análise, o pleito foi, à ocasião, acatado pela Diretoria Colegiada, ajustando-se a alocação de slots de forma que a empresa mantivesse a capacidade de realizar pelo menos uma operação diária em SBRJ, resultando na alocação de sete frequências semanais. Ressalto, todavia, que a solução adotada naquele caso se deu sem qualquer interferência à alocação de frequências previamente realizada para as demais empresas que operam no Aeroporto Santos Dumont (SBRJ). O que se verificou à ocasião foi uma flexibilização, ainda que de pequeno vulto, da restrição imposta por meio de Política Pública, de forma a acomodar a operação mínima pleiteada. Tenho que solução semelhante pode ser aplicada no presente caso.
Destaco, neste ponto, o teor do Ofício nº 143/2025/CDFN/GOV (SEI 11401188), de 09/04/2025, por meio do qual o Conselho Distrital de Fernando de Noronha solicita a expansão da malha aérea para a inclusão de dois voos entre Recife e Fernando de Noronha, indicando que "a inclusão de voos entre Recife e Fernando de Noronha beneficiaria significativamente a comunidade local, facilitando o acesso a transporte aéreo seguro e eficiente para os moradores e visitantes da ilha".
Nesse cenário, ainda que não haja, no momento, alteração nas premissas que fundamentaram a distribuição de frequências originalmente levada a efeito, reputo pertinente que eventual incremento na capacidade de ingresso de turistas na ilha – pelas autoridades competentes – seja tratado com base no precedente supracitado. Assim, eventual capacidade adicional poderia viabilizar a alocação das duas frequências semanais pleiteadas pela LATAM.
Ressalto que tal solução implica na necessária manutenção das frequências já alocadas às empresas AZUL e GOL, nos termos dos Ofícios nº 7 e nº 9/2025/GTRC/GEAM/SAS-ANAC. Eventual concessão das duas frequências adicionais à LATAM deve ocorrer única e exclusivamente mediante ampliação formal da capacidade de ingresso de turistas na ilha, devidamente autorizada pelos órgãos competentes.
Nessas hipóteses, as duas primeiras frequências adicionais (ou o respectivo número de turistas) que se tornem disponíveis deverão ser destinadas à LATAM. Obviamente, caso o incremento de capacidade superior ao equivalente às duas frequências adicionais, a distribuição deverá, no que exceder, observar critérios técnicos a serem definidos oportunamente.
Por fim, necessário pontuar que se por qualquer hipótese a eventual capacidade adicional venha a ser revertida, as duas frequências adicionais que porventura venham a ser alocadas à LATAM deverão ser as primeiras a ser suprimidas para adequação à capacidade de turistas na ilha.
Ademais, considerando as diversas manifestações ao longo do processo e, ainda que não se trate de aeroporto coordenado nos termos da Resolução ANAC nº 682/2022, recomendo que SAS acompanhe a conformidade em relação à alocação realizada e a utilização de frequências alocadas, avaliando periodicamente eventual necessidade de coordenação do aeroporto.
DO VOTO
Diante do exposto, VOTO por NEGAR provimento do pleito apresentado pela empresa LATAM, mantendo-se a alocação realizada pela SAS por meio do Ofício nº 9/2025/GTRC/GEAM/SAS-ANAC, de 01/04/2025 (11360399).
Sem prejuízo, destaco que eventual ampliação da capacidade de ingresso na ilha, devidamente atestada por autoridade competente, poderá ensejar futura reavaliação da alocação, conforme disposto no item 2.14 e seguintes.
Para tanto, solicito à SAS que oficie aos órgãos e entidades pertinentes, para conhecimento e eventuais providências, bem como mantenha acompanhamento sobre a possível revisão dos parâmetros de limitação de turistas, de modo a subsidiar eventual reanálise técnica.
Solicito ainda que aquela unidade acompanhe a conformidade em relação à alocação realizada e a utilização de frequências alocadas, avaliando periodicamente eventual necessidade de coordenação do aeroporto.
É como voto.
ADRIANO PINTO DE MIRANDA
Diretor Substituto
| Documento assinado eletronicamente por Adriano Pinto de Miranda, Diretor, Substituto, em 23/04/2025, às 18:56, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 4º, do Decreto nº 10.543, de 13 de novembro de 2020. |
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SEI nº 11422204 |