Timbre

Voto

PROCESSO: 00065.005780/2025-96

RELATOR: ADRIANO PINTO MIRANDA

VOTO-VISTA

DA ANÁLISE E FUNDAMENTAÇÃO

Trata-se de recurso administrativo interposto em face de Decisão de Primeira Instância relativa ao julgamento do Auto de Infração nº 161.I/2025, que no bojo da apuração da infração imputa ao aeronauta Reinaldo Júnior de Azevedo – CANAC 256815 a inserção irregular de 230h de voos em sua Caderneta Individual de Voo (CIV Digital) sem registros correspondentes em diário de bordo; sendo que parte desses lançamentos foram utilizados para comprovar experiência em procedimento de concessão de habilitação de Piloto Agrícola Avião (PAGA). Em decisão de primeira instância aplicou-se as sanções de multa no valor de R$ 24.569,90 (vinte e quatro mil, quinhentos e sessenta e nove reais e noventa centavos), cumulada com a penalidade de cassação de todas as licenças e habilitações do recorrente.

 

De partida, manifesto concordância com a íntegra do voto apresentado pelo Diretor-Relator (SEI 11803605) na 24ª Reunião Deliberativa Eletrônica da Diretoria Colegiada, realizada em 22/07/2025, todavia, faço objeção, tão somente, com relação à dosimetria aplicada à penalidade restritiva de direitos, conforme as razões que exponho a seguir.

 

Salienta-se, inicialmente, que a abordagem da teoria responsiva vem sendo adotada e aprofundada por essa Agência, especialmente em procedimentos sancionatórios, e isso tem se refletido na aplicação mais frequente de penalidades restritivas de direitos, tanto na forma de cassação (penalidade capital) quanto na suspensão temporária, total ou parcial, de licenças, habilitações e outras certificações (penalidade alternativa). Dessa forma, embora a atuação regulatória esteja se tornando mais escalonada e ajustada às particularidades de cada situação, a adequada dosimetria da penalidade tem exigido uma análise minuciosa do contexto infracional. Portanto, para assegurar que a resolução deste caso esteja alinhada com decisões deste Colegiado no âmbito responsivo, apresentam-se informações a serem sopesadas para o deslinde.

 

Adentrando ao mérito, é importante ressaltar que se por um lado, de forma categórica, a Primeira Instância e o Relator exauriram os aspectos de autoria e materialidade das irregularidades dos lançamentos na CIV Digital - que faço coro à qualificação da gravidade da conduta e às ponderações ali apresentadas pelos decisores - por outro, trago à consideração os seguintes pontos: (i) que as horas irregulares foram inseridas na CIV Digital em 15/06/2022, após a Agência ter concedido a licença de PCM (10/06/2022), de modo que os lançamentos irregulares não foram utilizados para a obtenção das licenças de PPR e PCM; (ii) conforme a CIV Digital (SEI 9332633), desconsiderando-se as 230 horas irregulares, na data da concessão da habilitação PAGA, o recorrente dispunha de 335h28min de voo, equivalentes a 83,9% da experiência exigida para concessão de tal habilitação; e (iii) que as irregularidades dizem respeito exclusivamente ao não cumprimento integral do requisito 61.243(a)(5), qual seja, o total de 400 (quatrocentas) horas de experiência geral para a habilitação PAGA, sendo que os demais 6 (seis) requisitos regulatórios específicos da habilitação, como treinamentos em CIAC certificado (SEI 10731471) e exames de proficiência, foram considerados pela área técnica aderentes ao RBAC 61. Ademais, além do lançamento fraudulento das horas, não há registro de apresentação de outros documentos adicionais ideologicamente falsos com o intuito de sustentar a irregularidade (como é comum em casos desta natureza), bem como não há registros de outras condutas voltadas a tentativas de ludibriar ou embaraçar a fiscalização, pelo contrário, o autuado colabora com a infração e declara sua intenção em retornar à regularidade.

 

Nesse contexto, é inegável que a fraude em registros pessoais de aeronautas é conduta muito grave e atenta contra o sistema regulatório da Agência, de maneira que se espera que a reprimenda aplicada seja capaz de alcançar os efeitos pedagógicos e reparatórios, desencorajando o recorrente e outros regulados a incorrer em conduta análoga. Nesse sentido, os princípios da regulação responsiva vêm sendo aplicado para auxiliar na dosimetria das sanções restritivas de direitos, indo além da capitulação da infração - ou seja, da natureza do requisito infringido, e adentrando em aspectos como o perfil do regulado, o contexto do ato infracional e os danos ao setor regulado. Caso contrário, aplicando-se uma mesma sanção tabular a qualquer descumprimento do requisito normativo, coloca-se em xeque o resultado esperado pela medida corretiva e, indo mais além, pode-se incentivar perversamente a perpetuidade da conduta infracional, haja vista que ao menor desvio a pena capital já lhe seria o desígnio certo.

 

 Somado a tudo isso, ainda tem-se que os processos sancionares que são deliberados em sessão pública pela Diretoria Colegiada - a qual garante o máximo de transparência e de alcance aos interessados - também se mostra uma ferramenta institucional para incentivar e demonstrar à universalidade de regulados que aqueles que se apresentam com postura colaborativa perante a fiscalização e que demonstrem real interesse em retorno à regularidade têm sanções distintas daqueles que obstaculizam o dever da ANAC em fiscalizar e exercer o pleno poder de polícia.

 

Portanto, considerando a qualificação do contexto exposto no item 1.4, avalio que a medida corretiva adequada para cumprir os objetivos sancionatórios e educativos é aplicar a penalidade de suspensão punitiva de todas as licenças e habilitações averbadas ao recorrente conforme dosimetria da Resolução nº 472/2018 e aplicar a penalidade de cassação (ou de seus efeitos) sobre a habilitação PAGA. Dessa forma, o recorrente somente poderá requerer nova habilitação PAGA após decorridos pelo menos 2 (dois) anos da data do ato administrativo que o notificou da aplicação dessa penalidade, e desde que fique comprovado que os motivos que levaram à cassação não mais existam ou não produzam mais efeito (61.13(c), RBAC 61)Assim, com base no art. 37 desta Resolução, a quantificação do período a ser suspenso deve partir de 60 (sessenta) dias, com abatimento de 20 (vinte) dias em razão da presença de atenuante ou acréscimo de 20 (vinte) dias para cada agravante. Valendo-se da análise realizada pela Primeira Instância e confirmada pelo Relator, verifica-se presente uma circunstância atenuante e nenhuma agravante. Dessa forma, a penalidade de suspensão deve ser fixada em 40 (quarenta) dias.

 

Quanto à sanção pecuniária, como já expressei anteriormente, assinto com a Decisão de Primeira Instância que foi confirmada pelo Relator, mantendo a aplicação de multa no valor de R$ 24.569,90 (vinte e quatro mil, quinhentos e sessenta e nove reais e noventa centavos), calculada conforme metodologia constante do art. 37-B da Resolução nº 472/2018, para as 77 condutas infracionais referentes ao lançamento de 93 voos irregulares em sua CIV Digital.

 

DO VOTO

Ante o exposto, VOTO pelo conhecimento do recurso administrativo interposto por Reinaldo Junior de Azevedo – CANAC 256815 e, no mérito, PELO PROVIMENTO PARCIAL, mantendo a sanção pecuniária aplicada pela decisão em primeira instância no valor total de R$ 24.569,90 (vinte e quatro mil, quinhentos e sessenta e nove reais e noventa centavos), cumulada com a sanção restritiva de direitos, na forma de suspensão punitiva de todas as licenças do interessado e habilitações a elas averbadas pelo prazo de 40 (quarenta) dias, bem como de cassação da habilitação PAGA nos termos do item 1.7 deste Voto.

 

É como voto.

 

 

LUIZ RICARDO DE SOUZA NASCIMENTO 

Diretor


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Documento assinado eletronicamente por Luiz Ricardo de Souza Nascimento, Diretor, em 16/09/2025, às 13:35, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 4º, do Decreto nº 10.543, de 13 de novembro de 2020.


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