Timbre

Voto

PROCESSO: 00065.008270/2025-71

INTERESSADO: THIAGO SARAIVA DE SOUZA OLIVEIRA

RELATOR: ANTONIO MATHIAS NOGUEIRA MOREIRA

 

fundamentação legal

A Lei nº 11.182, de 27 de setembro de 2005, em seu art. 8º, incisos X, XXXV e XLIII, estabelece a competência da ANAC para regular e fiscalizar as atividades da aviação civil, bem como reprimir infrações à legislação pertinente. 

A Resolução nº 381, de 14 de junho de 2016, que aprova o Regimento Interno da Agência, estabelece no caput do art. 9º que compete à Diretoria da Agência, em regime de colegiado, decidir, em última instância administrativa, as matérias de competência da Anac..

Já a Resolução nº 472, de 6 de junho de 2018, que disciplina as providências administrativas decorrentes do exercício das atividades de fiscalização no âmbito da competência da Anac, dispõe no §1º do art. 35 que, havendo recurso contra a aplicação de penalidade de suspensão ou cassação pela primeira instância, este deverá ser encaminhado diretamente à Diretoria.

Diante disso, resta evidenciado que a matéria sob análise é de alçada da Diretoria Colegiada, estando o encaminhamento realizado pela Assessoria de Julgamento de Autos em Segunda Instância (ASJIN) revestido de amparo legal (SEI 11990355).

análise

Dos autos, e conforme relatado, observa-se que o aeronauta THIAGO SARAIVA DE SOUZA OLIVEIRA foi regularmente notificado da emissão do Auto de Infração 292.I/2025 (SEI 11204346) em seu desfavor, ocasião em que lhe foi concedido prazo para apresentação de defesa, a qual foi protocolada tempestivamente e considerada na decisão em primeira instância administrativa. Posteriormente, o autuado foi notificado do teor da decisão administrativa em primeira instância e do prazo para apresentação de recurso, que está em apreciação na presente deliberação. Constatam-se, portanto, o respeito ao contraditório e à ampla defesa, bem como a regularidade formal do processo administrativo sancionador (PAS).

No que se refere à conduta imputada ao aeronauta, com base nas informações constantes dos autos, teria ele inserido na sua Caderneta Individual de Voo Digital (CIV Digital) 13 (treze) registros indevidos de voos sob as aeronaves PT-ETJ e PR-GCM, totalizando 21 horas e 42 minutos de voos que não encontram correspondência nos respectivos diários de bordo. Adicionalmente, o aeronauta teria apresentado declaração de instrução com autenticidade que foi negada pelo operador da aeronave PT-ETJ.

A manifestação do próprio interessado, tanto na defesa quanto no recurso (SEI 11377937 e 11853024, respectivamente), ao não questionar o mérito das constatações, mas apenas solicitar a consideração de circunstâncias atenuantes adicionais para a redução das sanção pecuniária, corrobora o resultado da apuração. Nessa linha, os documentos anexos ao auto de infração (SEI 1120437911204392 e 11204395) confirmam as irregularidades atribuídas ao aeronauta. O recorrente se valeu de registros irregulares de horas de experiência de voo, necessárias para cumprir requisitos previstos no RBAC nº 61, e com esse fornecimento de informações inverídicas à Anac – de voos que jamais existiram – obteve, de forma indevida, a habilitação de Piloto Agrícola - Avião (PAGA), restando configurada, portanto, infração ao inciso V do art. 299 da Lei nº 7.565, de 19 de dezembro de 1986 (Código Brasileiro de Aeronáutica), e ficando demonstrado que as condutas infracionais aqui tratadas são gravíssimas.

A Decisão Primeira Instância - PAS 95 (SEI 11739075) arrolou normativos que preveem a possibilidade da cassação nesses casos gravíssimos de infrações, entre eles o art. 164 do CBA, a seção 61.4 do RBAC nº 61 e o art. 35 da Resolução nº 472/2018. Ainda sobre esse ponto, mister destacar que a Diretoria desta Anac já possui entendimento firmado no sentido da aplicação da penalidade de cassação em vários julgados envolvendo casos semelhantes, relacionados a infrações decorrentes de fraude de horas de voo em CIV e obtenção de licença/habilitação com a utilização de horas fraudadas.

Conforme consta do RBAC nº 61, a CIV Digital é um banco de dados informatizado utilizado para verificação da experiência, comprovação e certificação de horas de voo do piloto. Assim, tais registros, feitos de forma individual e independentes, são aceitos pela Anac para demonstrar o cumprimento de requisitos necessários para concessão de licenças e habilitações, documentos esses obrigatórios para o exercício da profissão de piloto, o que demonstra a importância da veracidade dessa informação.

Portanto, restam claras as responsabilidades do recorrente tanto pelo fornecimento de informações adulteradas em relação aos registros em sua CIV Digital quanto no pedido indevido de concessão de sua habilitação PAGA, elevando, portanto, o risco à segurança de terceiros e ao sistema de aviação civil como um todo, o que corrobora a gravidade das condutas infracionais ora tratadas e reforça a violação aos deveres de boa-fé e idoneidade profissional.

Destaco também que a ANAC tem se empenhado continuamente na promoção da regulação responsiva, a qual demanda confiabilidade na relação entre regulado e regulador. Assim, ao apresentar informações falsas, em especial no contexto de processo de concessão de habilitação de piloto, o Recorrente violou a boa-fé e a lealdade para com a Anac, ferindo princípios que são indispensáveis no modelo de regulação que a Agência tem praticado com foco na promoção de segurança e qualidade do setor.

Nesse contexto, sopesando que fraude em registros pessoais de aeronautas é conduta muito grave e atenta contra o sistema regulatório da Agência, de maneira que se espera que a reprimenda aplicada seja capaz de alcançar os efeitos pedagógicos e reparatórios, desencorajando o recorrente e outros regulados a incorrer em conduta análoga, considero que, além da penalidade pecuniária, deve ser aplicada penalidade restritiva de direitos.

Nessa esteira, considerando o contexto das irregularidades, qual seja: i) que a fraude cinge-se à comprovação da experiência de piloto para obtenção da habilitação PAGA; e ii) que os lançamentos irregulares não foram utilizados para a obtenção das demais licenças e habilitações vigentes do aeronauta; avalio que a medida corretiva proporcionalmente adequada para cumprir os objetivos sancionatórios e educativos é aplicar a penalidade de suspensão punitiva de todas as licenças e habilitações averbadas ao recorrente conforme dosimetria da Resolução nº 472/2018 e aplicar a penalidade de cassação, bem como os seus correspondentes efeitos (61.13(c), RBAC 61), sobre a habilitação PAGA, em consonância com entendimento anteriormente já aplicado pela Diretoria em casos análogos (Voto 12026909 - processo nº 00065.006010/2025-61 e Voto 11945510 - processo nº 00065.005780/2025-96). Dessa forma, o recorrente somente poderá requerer nova habilitação PAGA após decorridos pelo menos 2 (dois) anos da data do ato administrativo que o notificou da aplicação dessa penalidade, e desde que fique comprovado que os motivos que levaram à cassação não mais existam ou não produzam mais efeito.

Para fins de dosimetria das sanções, diferentemente do que foi considerado pela primeira instância, entendo que também deva ser aplicada a circunstância atenuante de reconhecimento da prática da infração, prevista no inciso I do §1º do art. 36 da Resolução nº 472, de 2018. Conforme já mencionado anteriormente neste voto, restou claro que a argumentação apresentada pelo interessado na defesa e no recurso não contestou a conduta que lhe foi atribuída pela fiscalização da Agência, mas tão somente buscou a aplicação das circunstâncias atenuantes previstas no regulamento, tendo afirmado que o piloto reconheceu a conduta a ele imputada.

Assim, com base no art. 37 desta Resolução nº 472, de 2018, com a aplicação de duas atenuantes e nenhuma agravante, a penalidade de suspensão punitiva deve ser fixada em 20 (vinte) dias. No que tange à sanção pecuniária, propõe-se reforma do valor aplicado pela primeira instância para R$ 7.365,46 (sete mil trezentos e sessenta e cinco reais e quarenta e seis centavos), com a consideração de duas circunstâncias atenuantes para a definição do valor do fator "f" (2,15) na fórmula de decaimento exponencial prevista no art. 37-B da Resolução nº 472, de 2018.

voto

Ante o exposto, VOTO pelo conhecimento do recurso administrativo interposto (SEI 11853024) e, no mérito, por DAR-LHE PROVIMENTO PARCIAL, para alterar a Decisão Primeira Instância - PAS 95 (SEI 11739075), para a aplicação de sanção pecuniária no valor de R$ 7.365,46 (sete mil trezentos e sessenta e cinco reais e quarenta e seis centavos), cumulada com a sanção restritiva de direitos, na forma de suspensão punitiva de todas as licenças do interessado e habilitações a elas averbadas pelo prazo de 20 (vinte) dias, bem como de cassação da habilitação PAGA, nos termos do item 2.9 deste Voto.

É como voto.

ANTONIO MATHIAS NOGUEIRA MOREIRA

Diretor - Relator


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Documento assinado eletronicamente por Antonio Mathias Nogueira Moreira, Diretor, em 07/10/2025, às 12:13, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 4º, do Decreto nº 10.543, de 13 de novembro de 2020.


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