Voto
PROCESSO: 00058.078972/2025-19
RELATOR: TIAGO CHAGAS FAIERSTEIN
da competência
A exploração de serviços públicos mediante concessão é preconizada pelo art. 175 da Constituição Federal e regida pela Lei nº 8.987/1995. No setor da aviação civil, as condições de exploração pela iniciativa privada da infraestrutura aeroportuária por meio de concessão são regulamentadas pelo Decreto nº 7.624/2011.
Aplicam-se, ainda, às concessões de aeroportos o Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA); a Lei nº 13.448/2017, que estabelece diretrizes gerais para relicitação; e, subsidiariamente, a Lei nº 14.133/2021, que institui normas gerais para licitações e contratos com a Administração Pública.
A competência da ANAC para conceder ou autorizar a exploração da infraestrutura aeroportuária decorre da Lei nº 11.182/2005, nos seguintes termos:
Art. 8º Cabe à ANAC adotar as medidas necessárias para o atendimento do interesse público e para o desenvolvimento e fomento da aviação civil, da infraestrutura aeronáutica e aeroportuária do País, atuando com independência, legalidade, impessoalidade e publicidade, competindo-lhe:
I – implementar, em sua esfera de atuação, a política de aviação civil;
[...]
X – regular e fiscalizar os serviços aéreos, os produtos e processos aeronáuticos, a formação e o treinamento de pessoal especializado, os serviços auxiliares, a segurança da aviação civil, a facilitação do transporte aéreo, a habilitação de tripulantes, as emissões de poluentes e o ruído aeronáutico, os sistemas de reservas, a movimentação de passageiros e carga e as demais atividades de aviação civil;
[...]
XXI – regular e fiscalizar a infra-estrutura aeronáutica e aeroportuária, com exceção das atividades e procedimentos relacionados com o sistema de controle doespaço aéreo e com o sistema de investigação e prevenção de acidentes aeronáuticos;
[...]
XXIV – conceder ou autorizar a exploração da infra-estrutura aeroportuária, no todo ou em parte;
[...]
XXV - estabelecer o regime tarifário da exploração da infraestrutura aeroportuária, no todo ou em parte, e disciplinar a remuneração do seu uso;
A Solução Consensual (CSC-GIG), nos termos da Portaria Segecex nº 23, conforme processo TC nº 007.309/2024-4, foi composta por representantes do MPor, ANAC, CARJ, Advocacia Geral da União (AGU), SecexConsenso/TCU e AudRodoviaAviação/TCU, com o objetivo de elaborar uma proposta para reestruturar o contrato e pacificar controvérsias.
Concluídos os trabalhos, prosperou o entendimento da possibilidade de repactuação decorrente do entendimento autorizativo firmado pelo Egrégio Tribunal de Contas da União (TCU), que, por meio do Acórdão nº 1.260/2025 – Plenário, aprovou a proposta de solução consensual apresentada e autorizou a Presidência daquela Corte a celebrar o respectivo Termo de Autocomposição. Tal autorização viabilizou a formalização do instrumento pelas demais partes envolvidas, quais sejam: o Poder Concedente (ANAC) e o atual operador aeroportuário (CARJ), permitindo a continuidade das tratativas necessárias à adequada recomposição das condições contratuais, por meio de "Teste de Mercado".
Referido Acórdão também recomendou à ANAC e ao MPor que, além da realização de consulta pública aos potenciais interessados no leilão, fossem adotadas medidas para garantir transparência das alterações perante a sociedade e os usuários, garantindo a possibilidade de participação e contribuição destes, conforme se depreende dos itens transcritos a seguir:
(...)
9.1. aprovar, nos termos dos arts. 11 da Instrução Normativa TCU 91/2022, a proposta de solução consensual objeto deste processo, autorizando a assinatura, pela Presidência do TCU, do “Termo de Autocomposição”,
9.2. recomendar ao Ministério dos Portos e Aeroportos e à Agência Nacional de Aviação Civil que, além da consulta pública prevista para divulgar informações aos potenciais interessados no processo competitivo, adotem medidas para garantir transparência das modificações ora ajustadas à sociedade e aos usuários, de modo que possam contribuir com sugestões de melhorias às novas condições e termos da presente concessão;
Dessa forma, resta plenamente demonstrada a competência legal da ANAC para deliberar sobre a matéria e dar regular seguimento ao presente feito.
DAS CONSIDERAÇÕES
O procedimento administrativo instaurado pela ANAC para viabilizar a presente repactuação do contrato de concessão observou integralmente os parâmetros e diretrizes estabelecidos pelo TCU, mantendo plena aderência ao arcabouço jurídico e metodológico que fundamentou a solução consensual. Constatou-se, portanto, a estrita conformidade entre as etapas conduzidas pela Agência e os requisitos delineados pela Corte de Contas para a implementação do ajuste, assegurando a regularidade, a legitimidade e a coerência do processo decisório.
Desta forma, torna-se oportuno registrar que a presente deliberação deriva das conclusões constantes do Relatório do Acórdão nº 1.260/2025 – Plenário (TC 007.309/2024-4), o qual descreve de forma minuciosa a evolução do processo consensual conduzido entre as partes e que, ao final, revelou-se juridicamente e institucionalmente viável, com destaque para os fins deste voto, os seguintes aspectos:
73. Com base nos levantamentos e análises realizados, nas informações trazidas pelas partes, da inviabilidade do contrato atual, da relicitação, de possíveis opções de soluções e dos riscos identificados, a Comissão concordou que remodelar o contrato de concessão do Aeroporto do RIOgaleão mostrou-se o meio mais adequado e próprio à realização do interesse público no caso concreto e a medida mais vantajosa (ver seção 6.3) para a Administração Pública e para o usuário em contraponto às alternativas analisadas pela Comissão de Solução Consensual, de modo a promover a resolução de pleitos e pretensões entre as Partes.
74. Assim, a Comissão propôs a repactuação do contrato, e passou a desenvolver a solução nos moldes do Cenário B: uma remodelagem de alguns termos contratuais, incluindo atualizações: 1) no formato de contribuições ao sistema, alterando as contribuições de outorga fixa para variável, 2) no gatilho para a construção da terceira pista de pouso e decolagem, 3) no modelo econômico-financeiro, 4) modernizações regulatórias, 5) na participação da Infraero, e 6) no endereçamento de algumas interferências do sistema multi-aeroportos do Rio de Janeiro, de acordo com a premissa dada pelo Poder Público. Ainda, a solução proposta trata também da realização de investimentos e de valores de indenização, e, por implicar em mudanças no equilíbrio econômico-financeiro inicial, a solução propõe um teste de mercado, por meio de um processo competitivo.
(...)
228. O desenvolvimento de um mecanismo robusto que regule a mutabilidade de um contrato de concessão que seja alinhado com a supremacia do interesse público e a isonomia representa um grande avanço no aparato regulatório do Estado. Esse mecanismo é essencial para enfrentar as inevitáveis mudanças políticas, econômicas e sociais que ocorrem durante a vigência de uma concessão, e sua viabilidade reflete o elevado grau de profissionalismo e o avançado estado de maturidade das instituições brasileiras. Além disso, sinaliza uma evolução na interação entre o poder público e o mercado, aumentando a atratividade dos ativos da infraestrutura aeroportuária brasileira.
229. Embora a inovação traga riscos, seu desenho, idealizado por órgãos técnicos independentes de referência (Anac, TCU, AGU) e alinhado às políticas públicas nacionais do Ministério dos Portos e Aeroportos, incorpora a mitigação desses riscos e a conformidade legal, garantindo a indisponibilidade do interesse público. Com incentivos do livre mercado na precificação, busca-se um resultado imparcial e sustentável que assegure a adequação e atualidade do serviço, não apenas o prestado pela CARJ, mas por todo o sistema.
No caso do em concreto, a venda assistida se fortalece pelos seguintes fundamentos:
manutenção da continuidade operacional e mitigação de riscos de degradação dos serviços;
entrada de novo controlador com capacidade econômico-financeira e técnico-operacional adequada;
inviabilidade conjuntural de relicitação imediata;
necessidade de preservar investimentos já realizados e evitar custos elevados decorrentes de eventual caducidade;
alinhamento à política pública de reorganização do sistema aeroportuário do Rio de Janeiro/RJ e do país.
Conforme exposto no relatório[1], a presente deliberação se trata de proposta de publicação dos documentos jurídicos relativos ao leilão com vistas à realização do procedimento competitivo da Venda Assistida para repactuação do Contrato de Concessão nº 001/ANAC/2014 – SBGL, decorrente da solução consensual construída entre o Poder Concedente (ANAC), o Tribunal de Contas da União (TCU) e o atual operador aeroportuário (CARJ).
Cumpridas as etapas de participação social[2] e avaliação jurídica, consoante Parecer nº 60/2025 da Procuradoria Federal Especializada junto à ANAC[3], cabe ao Colegiado deliberar acerca da publicação do edital de venda assistida e do termo aditivo de repactuação revisados em razão das análises das contribuições oriundas da consulta pública e da Procuradoria Federal especializadas junto à ANAC.
As referidas revisões foram realizadas em razão das análises promovidas pela Superintendência de Regulação Econômica (SRA), constantes nos documentos técnicos dos autos deste processo[4]. Dentre as alterações promovidas, destaco:
correção de imprecisão que permitia interpretação de que a Controladora Atual estaria pré-habilitada a participar da etapa de viva-voz;
inclusão dos administradores da CARJ no rol de sujeitos obrigados a fornecer informações no âmbito do processo;
adequação integral do tópico que trata da troca de informações concorrenciais com a finalidade de mitigar condutas anticoncorrenciais;
restrição da execução da Garantia da Proposta apenas para a situação de não submissão dos documentos ao CADE no prazo previsto, excluindo situações de não aprovação ou de aprovação com restrição pelo CADE;
inclusão de mecanismo de indenização à Proponente Vencedora na hipótese de identificação ou materialização de passivos ocultos;
inclusão de item para realizar processo de revisão dos parâmetros da concessão em 2027, com o objetivo de atualizar o contrato;
inclusão de item de consulta aos usuários, com o objetivo de incentivar a cooperação efetiva e o compartilhamento de informações entre a Concessionária e as partes interessadas relevantes;
alteração da data de pagamento do saldo da Contribuição Inicial com o objetivo de viabilizar operacionalização do uso dos reflexos tributários;
inclusão de item que visa disciplinar o tratamento com Partes Relacionadas, adequando o contrato às mais recentes modernizações regulatórias;
com a finalidade de viabilizar a possibilidade de mútuos, exclusão das vedações relativas à concessão de empréstimos e financiamentos a acionistas ou Partes Relacionadas e à prestação de garantias a essas partes ou a terceiros;
com a finalidade de permitir a redução automática do capital social até o valor mínimo estabelecido, supressão da vedação absoluta à redução sem prévia e expressa autorização da ANAC.
Ademais, foram realizados ajustes pontuais com a finalidade de aprimorar conceituações, promover clareza nas regras, para corrigir erros meramente materiais, ou para excluir itens inócuos ou desnecessários, sem alteração relevante de conteúdo.
Vale registro ainda, a consolidação das constribuições da Consulta Pública nº 11/2025 que foram organizadas pela SRA, nos termos do Despacho SEI nº 12442233, consoante teor das respostas constantes da planilha de contribuições (SEI nº 12408570) e do Relatório (SEI nº 12442385), que também passam a ser objeto desta deliberação.
No entanto, nota-se que as respostas propostas às contribuições 31.831 e 31.834 da planilha de contribuições da consulta pública e do Relatório não contemplam os ajustes redacionais recomendados pela Procuradoria e validados pela área técnica nos termos do Despacho SRA 12437206. Isto posto, entendo que a planilha de contribuições da consulta pública e do Relatório devem ser aprovados com ressalva quanto as respostas às contribuições 31.831 e 31.834, para que a redação dos itens 6.2.1 e 6.13.1.1 do Edital seja corrigida para constar de acordo com Despacho SRA 12437206, mantendo-se ao final a última frase relacionada aos dois subitens seguintes quanto a obrigação do atual controlador perante o Comprador, a saber:
"6.2.1. Não haverá execução da Garantia da Proposta no caso de: (a) o ato de concentração não ser aprovado pelo CADE; ou (b) o ato de concentração for aprovado pelo CADE com restrições e a Anac entender que as restrições inviabilizam a transação).";
"6.13.1.1: Cláusula de Indenização: alocação de responsabilidade do vendedor: o CCVA deverá prever mecanismo de ressarcimento do vendedor ao comprador por condenações decorrentes de ações judiciais ou administrativas, cuja existência era formalmente conhecida pelo vendedor e não fora declarada ao comprador até a data da transferência do efetivo do controle e do pagamento do preço de compra (Data de fechamento). As informações poderão ser atualizadas pelo Vendedor até a Data de Fechamento, em todo caso, independente se oriundas de fatos ocorridos antes da Data de Fechamento. O atual controlador obrigar-se-á perante o Comprador:"
Considerando todo o exposto pela área técnica, incluindo as análises das contribuições recebidas na consulta pública e da Procuradoria Federal Especializada junto à ANAC, com os respectivos ajustes, aprimoramentos e exclusões nas minutas dos documentos, e considerando o entendimento da Procuradoria[5] de que o procedimento administrativo está aderente ao arcabouço normativo no qual foi gestada a solução consensual e atende, no que couber, à legislação de regência, não se identificando vícios ou nulidades que comprometam a juridicidade das minutas do edital de venda assistida e do termo aditivo de repactuação, entendo que as referidas minutas encontram-se adequadas para deliberação e posterior publicação.
Do voto
Diante do exposto, e considerando a legislação aplicável, as diretrizes definidas pela Comissão de Solução Consensual junto ao TCU, materializadas no Termo de Autocomposição (Acórdão n.º 1.260/2025-Plenário), os fundamentos apresentados pela área técnica (SRA) e o Parecer da Procuradoria Federal Especializada junto à ANAC, VOTO FAVORAVELMENTE a aprovação das minutas do Edital de Venda Assistida (SEI nº 12437239), do Termo Aditivo de Repactuação (SEI nº 12437243).
Por fim, VOTO FAVORAVELMENTE à aprovação do Relatório de Contribuições da Consulta Pública (SEI nº 12442385), e do teor da planilha de contribuições da Consulta Pública (SEI nº 12408570) com a ressalva apresentada no item 2.9 deste voto.
Entendo que os referidos documentos reúnem as condições necessárias para a adoção das providências subsequentes, em especial quanto a publicação do Edital e de seus anexos, com vistas à repactuação do Contrato de Concessão nº 001/ANAC/2014 – SBGL.
É como voto.
TIAGO CHAGAS FAIERSTEIN
Diretor-Presidente
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Relatório de Diretoria (SEI nº 12437811)
Consulta Pública nº 11/2025 (SEI nº 12080466)
Parecer 60/2025/FIN/PFEANAC/PGF/AGU (SEI nº 12427293)
Nota Técnica 37 (SEI nº 12407307) e Despacho SRA 12437206
Parecer 60/2025/FIN/PFEANAC/PGF/AGU (SEI nº 12427293) aprovado pelo Despacho de Aprovação 247/2025/GAB/PFEANAC/PGF/AGU (SEI nº 12427303)
| | Documento assinado eletronicamente por Tiago Chagas Faierstein, Diretor-Presidente, em 15/12/2025, às 16:15, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 4º, do Decreto nº 10.543, de 13 de novembro de 2020. |
| | A autenticidade deste documento pode ser conferida no site https://sei.anac.gov.br/sei/autenticidade, informando o código verificador 12441717 e o código CRC 193E6B68. |
| SEI nº 12441717 |